sábado, 22 de abril de 2023

Justiça, um caminho complexo

Algo que é inerente ao ser humano e a intensidade varia conforme a cultura de cada lugar, é a dificuldade em distinguir justiça de vingança. 

A linha que os separa é tênue, pois um está ligado intrinsecamente ao direito positivo, uma obra humana e o segundo, a vingança, tem sua estrutura no direito natural exigindo assim mais que técnica para a interpretação que mais se aproxime de justiça.

O caso do ex pastor Georgeval, recentemente resgatado na mídia em virtude do seu julgamento no qual foi condenado a 146 anos de prisão, despertou mais uma vez esse debate no que se refere ao tempo que um condenado pode permanecer atrás das grades. É apenas um exemplo. Não pretendo me aprofundar nas minúcias do caso pois tenho meu juízo formado a respeito.

Não sem razão, tendo em vista se tratar de um crime hediondo e envolver crianças e as pessoas em geral não tem uma visão processual dos fatos, se indignam em saber que embora a sentença determine 146 anos de prisão, o réu não poderá ficar lá mais do que 25.

O motivo disso é que por já ter cumprido 5 anos de reclusão e a nossa Lei Penal, na data em que o crime foi cometido, estabelecia que ninguém deve ficar mais que 30 anos em reclusão, resta ao condenado então "apenas" mais 25 anos e assim terá cumprido integralmente o que determina sua sentença condenatória.

Em 2020 essa Lei endureceu um pouco mais, ampliando o limite máximo de prisão para 40 anos. A partir da vigência dessa nova lei penal, ou seja, 2020, quem cometer um crime, for julgado e sentenciado, terá como período máximo de reclusão, 40 anos privados do convívio social.

Há propostas de ampliação para 50 anos o tempo máximo de prisão, porém os argumentos contrários e que se sustentam na incapacidade do Estado em suportar o já caótico sistema prisional, tem muita força entre os parlamentares. Não terá muitas chances de passar no Congresso, mas impossível não é.

Vejam, e já sendo repetitivo, o meu objetivo ao escrever o presente texto, não é fazer um juízo de valor sobre o crime citado e nem muito menos o sentimento das pessoas a este respeito. A indignação é parte importante para que haja um equilíbrio nesse sistema que embora tenha a pretensão de obedecer a uma certa lógica metodológica, não está imune às reações das pessoas em relação a sua funcionalidade. 

Se as pessoas não aprovam, é preciso rever os conceitos. Tudo é passivo de mudanças e a indignação popular, embora não possa ser considerada a única razão, não deve ser desprezada mas meticulosamente analisada pelo legislador.

É preciso avaliar o quanto se pode ainda avançar na adequação de um sistema que efetivamente produza o efeito necessário e assim, aquele que errou, não erre mais. Caso erre, terá muito mais tempo para refletir longe do convívio em sociedade. Do contrário, seremos forçados a considerar o retorno do "olho por olho, dente por dente", em resumo, a barbárie.

Sou a favor sim de que se amplie o tempo de prisão, sobretudo nos crimes de natureza hedionda e vou além: 

"Que não haja possibilidade de que o comportamento prisional, possa ser argumento a se considerar, na redução desse tempo de reclusão".

O mínimo que a pessoa deve ter para conviver socialmente é saber que o seu direito fundamental à vida, também vale para o outro. Simples assim.

Respeitando as opiniões contrárias, encerro este texto lembrando ao leitor que nessa mesma linha de raciocínio, que tem por fio condutor a eficácia da punição como medida de enfrentamento a violência, defendo também o pleno direito de defesa. 

Mesmo recluso, acredito que aquele a quem o Estado julgou e condenou, poderá sempre ter a oportunidade de provar o contrário, que não cometeu o crime ao qual lhe foi atribuído e assim, voltar ao convívio social.

São Mateus-ES, 22 de Abril de 2023

Carlos Quartezani